E que tal uns pontos nos ii’s? _ Se os socialistas europeus quisessem «mudar de paradigma», como diz a minha amiga Ana Gomes, apresentariam um candidato próprio à presidência da próxima Comissão Europeia. Deste modo, davam, pelo menos, um sinal convincente aos eleitores. Com efeito, não é fácil convencê-los de que querem mesmo «mudar de paradigma» se acham muito bem que a União continue amarrada a «um rosto do passado», como sintetizou Mário Soares.
É para o caso irrelevante que não sejam os partidos, mas os governos quem propõe o candidato a presidente. Os socialistas podiam ter um nome que desse rosto à tal «mudança de paradigma», independentemente da sua posterior viabilidade. Sucede que os líderes socialistas não quiseram seguir por esse caminho. José Sócrates explicou porquê: eles acham que «Durão Barroso fez bom trabalho». Esta não é sua opinião pessoal, mas uma avaliação partilhada pelos seus congéneres em Espanha, no Reino Unido ou na Alemanha. Estão, aliás, bem acompanhados: toda a direita europeia, da ponta de Sagres à mais recôndita ilha do Báltico, pensa rigorosamente do mesmo modo. Quem engana quem?
Não foi a primeira vez que José Sócrates elogiou os ofícios de Durão Barroso. É uma posição de partido e uma posição de Estado, de resto comunicada aos eurodeputados portugueses como uma «prioridade das prioridades». Nos assuntos de Bruxelas, não se brinca em serviço. Com excepção de Sarkozy – que gostaria de ver o seu primeiro-ministro a presidir à futura Comissão – todos os ‘grandes’ torcem por Barroso. Porque ele é duro? Ou porque, embora Durão de nome, é substantivamente dócil? O leitor que conclua por si. Dir-me-ão: mas também é apoiado pelos médios e pelos pequenos. Porque esperam que ele os defenda dos grandes? Ou porque, conhecendo os cantos à casa e habituados a disputar arduamente os seus restos, todos preferem estar com quem ganha, a arriscarem «mudanças de paradigma»?
Conclua, sabendo que Portugal está longe de ser o único ‘bom aluno’ da confraria.
O slogan que o PS lançou para as europeias é, a esta luz, bem sintomático. Não porque lhe falte o verbo ou porque seja possuído pelo gongorismo dos plurais majestáticos de assinatura singular. Isso é lá com os publicitários. O que o transforma num verdadeiro programa é a sua própria vacuidade. Ele é o europorreirismo em acção, um cancro que se tem revelado tão pernicioso a um projecto europeu democrático e social quanto o eurocepticismo de recorte nacionalista.Devia ter escrito – mais pernicioso. Porque o nacionalismo se reforça na exacta medida em que os ‘porreiros’ só se lembram dos europeus quando deles precisam. Ou já se esqueceram que somos tão europeus para as europeias, como pacóvios e ignorantes para nos pronunciarmos em referendo sobre o próprio futuro da Europa?